terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Leave it to Chance

por Katchiannya Cunha



Quando em 1996 a WildStorm Productions lançou o selo Homage Comics, os leitores não esperavam menos que muita, muita qualidade, já que não era todo dia que uma mesma linha de quadrinhos tinha reunida em si profissionais do calibre de Kurt Busiek, Terry Moore, James Robinson, Paul Smith e Alex Ross. E realmente qualidade foi o que não faltou em séries como a premiadíssima Astro City, de Busiek e capas de Alex Ross, Strangers in Paradise, de Terry Moore, e Leave it to Chance, da dupla Robinson e Smith. Mesmo com a saída de Moore, que resolveu continuar sua série em seu próprio estúdio, o Abstract, o selo não perdeu força e lançou mais dois outros títulos: Damned e Desperadoes.

Enquanto Busiek contava histórias sobre uma cidade abarrotada de heróis e de seus moradores (superpoderosos ou não) e Moore falava do dia-a-dia de duas garotas comuns, Robinson juntou-se a Smith para contar as aventuras de uma garota cujo maior sonho é tornar-se combatente do sobrenatural como seu pai.

James Robinson e Paul Smith já haviam trabalhado juntos na aclamada minissérie Golden Age, sobre os heróis da DC da Era de Ouro dos quadrinhos. Enquanto Robinson é bastante conhecido pelo seu trabalho na série Starman (que teve pouquíssimos números publicados aqui no Brasil pela editora Magnum e pela Tudo em Quadrinhos), Smith é um velho conhecido dos fãs (mais antigos) dos X-Men, através de histórias publicadas em Superaventuras Marvel.





A série Leave it to Chance conta a história de Chance Falconer, uma adolescente de 14 anos filha de Lucas Falconer, o Protetor Oculto da cidade de Devil's Echo, uma cidade em que o sobrenatural é a coisa mais natural do mundo. Chance se encontra na idade em que todo Falconer começa a treinar para se tornar protetor da cidade, mas devido a uma tragédia do passado (uma batalha entre Lucas e seu arquiinimigo, Miles Belloc, custou a vida da mãe de Chance e a mutação do rosto de Lucas) Falconer não quer que a filha se envolva nos negócios da família. Ele prefere esperar que Chance se case e tenha um filho para substituí-lo (pouco machista, não?). Mas apesar da desaprovação do pai, Chance, determinada a continuar a tradição familiar, acaba se envolvendo em diversas aventuras.

Para auxiliá-la, Chance conta com a ajuda de um dragãozinho de outra dimensão chamado St. George (que lembra bastante o Lockeheed da Kitty Pryde). Esse dragão foi uma aquisição de uma das aventuras de Lucas, e ela o mantinha preso em uma gaiola enquanto tentava mandá-lo de volta para sua dimensão. Com pena do bichinho, Chance o libertou e depois disso nunca mais St. George a abandonou, além de ter salvado a vida da nossa heroína diversas vezes.



Assim como Batman, Chance também tem seus contatos na polícia. Sua "Comissário Gordon" se chama Margo Vela, policial da Unidade de Crimes Arcanos do Departamento de Polícia de Devil's Echo. Destemida, independente e corajosa, além de excelente detetive, ajudou Chance em seu primeiro caso, que envolvia o desaparecimento de um Shaman e pobres e indefesos duendes de esgoto. Desde então, a colaboração entre as duas se tornou constante. Para completar o time, temos ainda o repórter do "Devil's Echo Oracle", William Bendix, que parece ter um talento nato para solucionar mistérios e crimes sobrenaturais. Margo e William parecem ter uma indizível "queda" um pelo outro, disfarçada pelo clássico insulto mútuo, apesar de trabalharem bem juntos e se respeitarem como profissionais.

Além de tudo, Chance ainda tem o seu "Alfred": Hobbs, um mordomo inglês que foi herói na II Guerra Mundial. Conhecendo Chance desde bem pequena, é uma espécie de conselheiro da menina. Sem falar que é um excelente mecânico, tendo construído o carro voador da nossa heroína.



Nas histórias aparecem os mais variados tipos - desde sapos gigantes, feiticeiros indígenas, cultuadores de Satã que ao invés de sacrifícios humanos querem matar inocentes miquinhos, fadas, fantasmas de piratas em busca de tesouros perdidos, duendes de esgotos, zumbis com coração de ouro, enfim, coisas de dar inveja à mais louca aventura do Scooby-Doo. Isso sem falar nas homenagens aos clássicos do terror, como O Fantasma da Ópera (no caso um Fantasma de Shopping), ou a Drácula, Frankenstein, Lobisomem e a Múmia, que saíram literalmente das telas do cinema em uma das edições.

Se em Starman a fascinação de Robinson pelos quadrinhos, cinema e clima da "Era de Ouro" já estava presente, seja na caracterização de Opal City, nas contínuas referências aos super-heróis desse período ou no amor de Jack Knight por "velharias", em Leave it to Chance essa fascinação ultrapassa a referência e é visível inclusive no estilo da narrativa. O clima de mistério típico de filmes noir, o terror não sanguinariamente explícito e um ar de inocência como há muito não se via nos quadrinhos atuais lembram bastante clássicos como Tintin, Terry e os Piratas, Dick Tracy e o Spirit, do mestre Wil Eisner, ou mesmo as antigas histórias do Batman, entre outros. Essas características são muito reforçadas pelos desenhos de Smith, muito mais estilizados nessa série que na época em que desenhava os mutantes. Essa é uma daquelas raras séries em que nem o desenho nem o texto se sobressaem, mas se completam mutuamente, podendo figurar na galeria de honra de seus criadores.

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